O presidente da República está desprovido de razão ao advertir publicamente e com intensidade e veemência, que uma convulsão social e um futuro cinzento poderão ocorrer se uma de suas vontades não for saciada, que é a aprovação do voto impresso. Em transmissão ao vivo nas redes sociais, ele defendeu a análise do tema pelo Congresso Nacional, mesmo sabendo que o voto impresso já foi considerado inconstitucional em 2018 pelo Supremo Tribunal Federal e é criticado pela Justiça Eleitoral, que o vê como alternativa custosa e insegura. Ou seja, paira no ar um grau de desconhecimento do Chefe do Executivo Federal sobre como o sistema funciona e como ele pode ser auditado.
Trata-se de uma atitude absurda, porquanto não há razão para impor que exista um papel registrando os votos de cada urna, quando diversas fases de auditagem do voto eletrônico já estão consolidadas. Tal fato só demonstra que o atual Chefe do Poder Central chegará muito enfraquecido na eleição presidencial de 2022.
Ora, já existe como dito, mecanismos para a conferência das urnas eletrônicas e sem nenhuma complexidade, ao contrário do que acontecia na época das cédulas de papel, onde a possibilidade de fraudar uma eleição era indubitável.
São sete etapas iniciais de checagem, além de existir uma oitava auditoria a que o processo eleitoral, através do voto eletrônico é submetido em que diversas organizações representativas da sociedade civil são chamadas a acompanhar, a exemplo da OAB, universidades, Ministério Público, partidos políticos etc. E se alguém quiser conferir os votos, basta um simples requerimento. Ou melhor, passada a eleição, qualquer partido ou interessado pode solicitar ao TSE, no prazo de 100 (cem) dias, o registro digital do voto para fazer sua recontagem, de forma automática, e com seus próprios softwares.
Desde o ano de 2003 que foi criado o registro digital do voto, mecanismo que preserva o voto digitado pelo eleitor na urna, sem violar o sigilo. O RDV é a versão digital da antiga urna de lona em que os votos eram depositados.
Ou seja, trata-se de mais um dispositivo de auditoria, que consente a contagem eletrônica de votos (o que rechaça erros humanos na escrutinação manual) e certifica que ninguém violará o sigilo do voto de cada eleitor. Se o partido quiser, pode até imprimir esse registro. Aliás, todos os arquivos gerados pela urna podem ser solicitados para conferência.
E mais, a partir da Constituição de 1988, tornou-se cláusula pétrea o voto “direto, secreto, universal e periódico”, onde se conclui que a aceitação do voto impresso seria impossível, mesmo que aprovado pelo Congresso.
Em verdade, Bolsonaro tenta fazer de forma prévia, o que o ex-presidente Donald Trump fez na eleição dos Estados Unidos, caso saia derrotado na eleição do ano vindouro. Essa é a intenção.
Se o argumento para o registro em papel é a chance de conferência da votação nas urnas, já existe o registro digital do voto. Se autêntica a suspeição de que o sistema de votação eletrônica pode ser adulterado, não há por que pressentir que uma tira de papel saída desse mesmo sistema não possa ser também corrompida. Importante lembrar, que desde a implantação das urnas eletrônicas em 1996, jamais se documentou qualquer episódio de fraude.
Tudo são pretextos para tentar desmoralizar as instituições, que podem impossibilitar seus anseios ilegítimos.
Sem esquecer do objetivo primordial de Bolsonaro, que é o de se eternizar no poder.
João Pessoa, julho de 2021.