Demétrius Faustino
As histórias de toda cidade estão entranhadas nos seus espaços, porque são eles que melhor revelam as sociabilidades vividas. Nesse contexto as praças ocupam posição de destaque.
É na Praça que se cruzam diariamente sonhos, estado de espírito, esperanças, risos, lágrimas, e tudo o mais que os seres humanos deixam escapulir pelas janelas da alma. Mas é preciso antes de tudo, zelar por esse tipo de patrimônio, tanto na seara material, como imaterial.
Moramos nas proximidades da Praça da Paz, no Bairro dos Bancários, espaço que um dia foi preservado, com um zelo bem-sucedido, mas que hoje, pela falta de cuidado, sua vida plena não está resistindo ao tempo.
Quem melhor define esse cenário, é o morador de nome Geraldo Barroso da Silva, pois quase todos os dias aproveita a Praça da Paz para fumar seu cigarro antes de ir para o serviço. Semana passada no cumprimento desse ritual, e passeando pelos jardins desta, a imagem lúgubre chamou sua atenção. A poucos metros de onde se encontrava, entre as árvores frondosas, ele avistou e sentiu que aquela paisagem está sem identidade ideológica, onde o seu primeiro impulso foi coçar a cabeça desarrumando os parcos fios de cabelo, olhar a bicicleta que descansa o pedal na ponta do passeio, e lembrar em bom som o quão era belo esse porto seguro num passado distante.
Aliás todos percebem esse desastre, e portanto, partindo da teoria e da premissa de que há uma gestão ausente, outras forças paralelas assumiram o espaço ditando seus valores e implantando seu poder.
É fato que o Bairro dos Bancários apresentou vertiginoso crescimento nas duas últimas décadas, despontando como uma das áreas de maior crescimento imobiliário da capital paraibana. Com essa especulação imobiliária, que destruiu a maioria das casas e permitiu a construção das torres de apartamentos e escritórios, o Bancários está entre os bairros que abriga os prédios mais caros da cidade. Entretanto, o motivo mais específico para viver nesse lugar, é estar perto da Praça da Paz com seus espaços intangíveis e que são contemplados pelos moradores do bairro.
Era uma agradável cidade-jardim, mas que hoje considerando sua finalidade, está sendo apenas uma passagem da gente que vai e vem sem a perceber. Já não pode ser vista como um lugar educativo e cultural, pois até um trecho de um poema de Lucio Lins inserido numa escultura em metal e o anfiteatro em sua homenagem, estão como uma lixeira viciada. Essa mesma Praça da Paz, já foi parada constante desse poeta do mar.
Toda essa situação tem gerado o agravamento do stress cotidiano, conflitos interpessoais, envolvendo uma complexidade de sentimentos e instintos, pois não é admissível deixar desbotar o verde da Praça da Paz, assemelhando-a a pontos de incêndio. O coração do Bancários sangra, pois ali morava a felicidade, e a inspiração pelos ares de liberdade.
Está suja, mal cuidada, fazendo com que o aglomerado de gente sem destino, destine ali mesmo necessidades fisiológicas, e colabore para exalar desagradável odor.
A essa praça já foi atribuído o conceito de se constituir no lugar que ancora poetas, músicos, e outros aculturados. Ela também já foi simbolismo, religiosidade, política, movimento, geografia e arquitetura.
Salvem a Praça da Paz, pois apenas os teimosos saudosistas é que estão ainda frequentando-a, resistindo a total ignorância dos responsáveis pela sua gestão, fazendo vista grossa de um problema tão recorrente.
Nos dias de hoje, com certeza, o poeta Lúcio Lins não encontraria inspiração ou novo alento para escrever seus versos, pois a travessia tomou outro rumo.
É como se a história do bairro fosse passando na janela dos nossos olhos.
Salvem a PRAÇA DA PAZ.
João Pessoa, fevereiro de 2020.