O sociólogo Richard Giulianotti, em uma passagem de sua obra Sociologia do Futebol – Dimensões históricas e socioculturais do esporte das multidões, utiliza a seguinte frase: Nenhuma outra forma de cultura popular engendra uma paixão ampla e participativa entre seus adeptos como a que se tem pelo futebol.
De fato, se depender do senso comum, o futebol é o ópio do povo, pois fascina e serve como a verdadeira libertação levando os homens, inclusive, a extremos atos de sandice.Que o diga as torcidas organizadas.
Mas no futebol há também momentos frustrantes, e um deles ocorreu na Copa do Mundo de 1986, disputada no México, depois que a Colômbia desistiu de ser sede em razão da violenta guerra do narcotráfico.
Essa competição para o Brasil começou tumultuadajá antes do embarque da seleção, em razão do fim do mandato de Giulite Coutinho na presidência da CBF, que deixou os cartolas mais atribulados com a batalha eleitoral do que com a organização da equipe brasileira.
Ou seja, desde o início a bruxa estava solta. Basta dizer queRenato Gaúcho fora cortado; Leandro no dia do embarque desemparara a delegação; Zico solicitou a Telê para não ser convocado, já que não se recuperara de grave lesão no joelho sofrida no ano de 85. Aliás, e quanto a este fato, dizem que a imprensa apurou, e conclui que Telê Santana lhe teria pedido para fazer parte da delegação e entrar nas partidas em andamento, quando fosse necessária sua presença.
Mas o pior de tudo foi a nossa despedida da competição já nas quartas de finais com a derrota para a França, nas penalidades.
Foi um jogo com um primeiro tempo super movimentado, onde a primorosa troca de passes entre Júnior e Müller terminou com a finalização precisa de Careca que vivia uma grande fase no São Paulo antes de se transferir para o futebol italiano, para abrir o placar. Müller quase fez o segundo, mas acertou a trave. Já o empate da França sairia antes do intervalo. A bola cruzou a área de Carlos e Platini estava livre para escorar na segunda trave. O único gol que o Brasil sofreu em toda aquela Copa.
Foi um jogo difícil, quando aos 26 minutos do segundo tempo, o jovem Müller é substituído pelo eterno 10 do Flamengo. Com três minutos de participação na partida, o Galinho de Quintino tabelou com Branco deixando-o cara a cara com o goleiro, quando este o derrubou, dentro da área.
Nesse instante a torcida já estava entendendo que o Brasil passaria para as semifinais da competição, pois um gol àquela altura da partida a seleção brasileira decidiria a peleja.
Com Zico em campo, pênalti era com ele. Dizem até que Sócrates se ofereceu:Quer que eu bata, Galo? Valeu Magrão, mas deixa comigo, teria respondido o camisa 10. Frente a ele, que se diga de passagem, Zico era um dos maiores cobradores de pênalti do mundo, estava o goleiro Joel Bats. E para a frustação da torcida brasileira Bats defendeu a cobrança, e que mais tarde, reconheceu ter contado com a sorte escolhendo um canto para o salto que o levou à bola.
E até hoje reina uma pergunta sobre aquela fatídica tarde: Zico estava, por assim dizer, frio, já que acabara de entrar em campo? Sócrates deveria ter assumido a cobrança?
Para sorte da nossa seleção, o empate perdurou e a decisão foi para os pênaltis. Sócrates bateu o primeiro fazendo uma breve parada para deslocar o goleiro, e perdeu, e depois caminhou lentamente de volta ao meio-campo, onde estavam seus companheiros;Alemão bateu o segundo e converteu; Zico fez o terceiro; Branco converteu o quarto; mas, para a nossa tristeza, o zagueiro Júlio César viu sua cobrança morrer na trave.
Foi um jogo dramático, nervoso, sofrido, traumatizante, e de triste memória para a torcida brasileira.
De qualquer forma, admiramos a coragem de Zico que não se escondeu, depois do erro no tempo normal, e nas cobranças de penalidades fez a sua parte.
Fica então outra pergunta: O Brasil saiu da copa por causa da penalidade perdida no tempo regulamentar?
João Pessoa, outubro de 2021.