Minha Mãe veio ao mundo em uma véspera de Natal…
A despeito da sugestiva época, nada de excepcional havia a registrar na chegada da menina apresentada ao mundo pelas mãos de parteira…
Como toda mortal terrena, o nascimento, apesar das luzes de clima natalino não teve glamour, presépio, Reis Magos, ou Estrela-Guia, quiçá ocorreu na cidade de Belém. O local era Buerarema e quis o destino que Mainha viesse ao mundo exatamente no ano de emancipação do município, antes chamado de Macuco, um remoto lugarejo encravado, quase emburacado no sul baiano.
Tudo isso nos idos da década de 50.
Voltando ao aniversário, curiosamente, neste mesmo 24 de dezembro, minha Mãe está retornando da Paraíba à Bahia.
Na exata data em que chegou ao mundo, que celebramos a existência dela em nossas vidas, ela se despede de nós, após mais uma curta jornada de visita.
Tem sido assim há 20 anos, desde que vim morar nas bandas da Paraíba do Norte, quando me desgarrei fisicamente dos meus pais, de casa… Chegadas e partidas tem sido nossa rotina…
A euforia de chegar e já nos primeiros dias sofrer antecipadamente pela hora de partir vindoura…
Me conformo, absorvo, resigno e sigo o fluxo. Mas não me acostumo. Ainda sofro e, confesso, às vezes me derramo, sozinho…
Mirradinha, minha mãe se agiganta perante todos nós. Tudo bem, ela já foi uma “bolotinha”, com mãos pesadas, que também sabiam ser utilizadas para repreender, ensinar. E é essa Bolotinha quem permanece no meu imaginário ainda hoje. Assim carinhosamente a chamo, talvez tentando eternizar a melhor fase da minha vida, que é a que ela mais tem saudades também: a infância minha e de meus irmãos (os pais sempre são nostálgicos, saudosistas. Especialmente sobre a nossa infância). Já nós passamos a primeira parte da vida teimando em querer acelerar o tempo, os passos, renegando os conselhos de aproveitarmos ao máximo e buscando quase à marra, ser “de maior”.
Voltando a mainha… é uma Leoa a aninhar a todos, ou quem sabe uma mamãe-polvo a envolver igualmente todos os seus em seus braços e tentáculos! Mesmo sem possuir os 3 corações do bicho marinho (porque aí já seria demais), no solitário dela cabe todos nós e ele pulsa sincopadamente como em um momento de atração sonar para trazer-nos, todos, de volta às origens.
Só a completude a preenche. Só todos os dela reunidos a torna plena. Senão, são apenas momentos, alegrias intensas, pontuais, direcionadas, mas não por inteiro.
É ela quem programa e sonha, quase devaneia em círculo… com todos dentro, claro. Aquela reunião que, sempre rara, é também inesquecível, indelével.
E olha que, direta e indiretamente, apenas entre filhos e netos, já somos mais de uma dezena sob esse escudo protetor (4 filhos, 7 netos a 100km por hora, uma neta encomendada, meu pai-pois sim, maridão também entra no bolo- e outros “agregados”.
Minha Mãe cuidou e cuida do meu primogênito, como extensão minha, como a melhor sequência dela. É nela que ele tem o porto seguro, juntos eles transcendem o entendimento e zelo mútuo.
Pois é, lá em casa já cresci assim, em regime matriarcal, guiado pela força e sabedoria feminina.
Aliás, bem antes do matriarcado ser apropriado ideologicamente e virar termo Cult, já era posto em prática “à vera” na minha genética. Minha Avó materna é a tradução literal do termo.
Se, por forças das circunstâncias da “vida como ela é”, metade da minha existência foi em torno desses eventos extraordinários de ter e estar com minha mãe entre chegadas e partidas, sei que, apesar da falta, carência e ausência física aqui lado a lado, ela sempre esteve e permanecerá comigo. E, na real, eu ainda sequer saí do seu ventre.
Quem já me amava antes mesmo de eu existir permanece sendo minha melhor amiga e confidente. Para todo o sempre, aqui, agora, ou alhures, em outro tempo-espaço.
Obrigado Natureza, obrigado Mãe, por tudo!
É só amor…