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Governo federal declara de interesse social para desapropriação área quilombola na Paraíba

O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, assinou na quinta-feira (20), Dia da Consciência Negra, 28 Decretos de Declaração de Interesse Social para Fins de Desapropriação de áreas de quilombos em 14 estados brasileiros. Um dos decretos reconhece como de interesse social os imóveis rurais com domínio válido e abrangidos pelo território quilombola Engenho Mundo Novo, localizado no município de Areia, na região do Brejo Paraibano.
O Decreto Nº 12.737 foi publicado no Diário Oficial da União (DOU) desta sexta-feira (21) e é um passo essencial para avançar na titulação definitiva do território reivindicado pela comunidade quilombola, formada por 39 famílias. A área de 322,3565 hectares (trezentos e vinte e dois hectares, trinta e cinco ares e sessenta e cinco centiares) e é reconhecida e declarada pela Portaria nº 469, de 9 de agosto de 2017, do Incra, como terras da comunidade.
A presidente da Associação da Comunidade Negra Mundo Novo, Ana Paula Gomes da Silva, 38 anos, falou sobre a importância da publicação do Decreto para as famílias da comunidade.
“Foi uma grande conquista. É um sonho que a gente tinha há muitos anos, é um porto seguro. Agora vamos ter liberdade de poder ir e vir sem medo. É uma grande conquista para a comunidade, que está em festa. Quando eu recebi a notícia, eu chorei muito porque essa luta vem da minha avó, que nunca desistiu de lutar, mas já não está mais aqui”, disse Ana Paula.
Além de continuar o trabalho com a produção agrícola, a comunidade pretende aumentar os investimentos em outra vocação da região, o turismo rural. Ana Paula contou que já existe um restaurante na comunidade e que as famílias pretendem procurar o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para reformar a casa-grande.
“Queremos fortalecer nosso trabalho com a agricultura e também com o turismo rural. Já estamos recebendo turistas na nossa comunidade. Já temos um grupo de dança que envolve a juventude da comunidade e um restaurante. Temos muitos planos, como transformar a ‘Lagoa do Jacaré’, que faz parte da nossa história, em um ponto turístico. O que a gente esperava era essa oportunidade”, afirmou a presidente da associação de Mundo Novo.
RTID
O resumo do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) da comunidade foi publicado no DOU em 14 de abril de 2015. O trabalho técnico, o primeiro passo no processo de regularização da comunidade, identificou o território em uma área de aproximadamente 322 hectares.
O RTID é produzido por uma equipe multidisciplinar e reúne informações sobre a história, a ancestralidade, a tradição e a organização socioeconômica das famílias. É composto pelo relatório antropológico, que aponta os aspectos históricos e socioculturais da comunidade, bem como a relação deles com o território a ser delimitado, e ainda pelo Laudo Agronômico e Ambiental, pelo levantamento dominial do território, pelo cadastro das famílias pertencentes à comunidade e pelo Mapa e Memorial Descritivo da área.
O relatório antropológico do RTID da Comunidade Quilombola Engenho Mundo Novo foi produzido pelos antropólogos Rodrigo Domenech e Adrian Ribaric, através de contratação feita pelo Incra Sede.
A comunidade foi reconhecida como remanescente de quilombo pela Fundação Cultural Palmares em Outubro de 2009, quando também foi aberto o processo de regularização fundiária do seu território junto ao Incra.
Moradores livres e descendentes de escravos
De acordo com informações do relatório antropológico do RTID da Comunidade Quilombola Engenho Mundo Novo, ela é formada por descendentes dos primeiros trabalhadores da antiga fazenda Engenho Mundo Novo que, após a morte do proprietário e a desestruturação do imóvel, permaneceram nas terras onde nasceram e nas quais vivem e trabalham há pelo menos quatro gerações.
A fazenda era composta por grande área de plantio de cana-de-açúcar, de pasto para a criação de animais de tração (boi, cavalos e muares), pela casa grande – complexo que contava com diversas edificações –, e pelo engenho propriamente dito, além da área destinada para habitação e subsistência dos trabalhadores.
Alguns moradores se estabeleceram nas terras dos engenhos da família como moradores livres, outros são descendentes de antigos escravos que pertenciam à família e trabalhavam em seus engenhos de rapadura e aguardente, sobrevivendo da agricultura e pecuária de subsistência praticada em pequenos lotes.
Ainda segundo o relatório antropológico, a escassez de espaço para a agricultura é o principal responsável pelas precárias condições de vida verificadas no estudo, fato agravado pelo contexto histórico de formação da comunidade e pela situação conflituosa com os herdeiros da propriedade. Após a desestruturação da fazenda, as famílias ficaram restritas a uma área descontínua de 93,5 hectares correspondente à soma da área dos sítios familiares garantidos liminarmente através de ação de manutenção de posse ajuizada na 4ª Vara Federal de Campina Grande.
Atualmente, as famílias vivem da agricultura, mantendo plantios tradicionais, como milho, feijão, mandioca, macaxeira, banana e hortaliças. A produção de algumas famílias é vendida para o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). A maior parte das famílias possui quintais, onde cultivam frutíferas, temperos e ervas e criam animais de pequeno porte, além de poucas cabeças de gado.
Processo de Regularização Quilombola
As comunidades quilombolas são grupos étnicos formados majoritariamente por população negra que se reconhece por vínculos com a terra, o território, a ancestralidade e práticas culturais próprias. Estima-se que existam mais de três mil comunidades no país.
Para iniciar a regularização do território, a comunidade deve solicitar ao Incra a abertura do processo e apresentar a Certidão de Registro no Cadastro Geral de Remanescentes de Quilombos, emitida pela Fundação Cultural Palmares.
O Incra realiza então os estudos para elaboração do RTID. Após a fase de contestações e sua análise, o RTID aprovado embasa a portaria de reconhecimento dos limites do território.
Na etapa seguinte ocorre a regularização fundiária, com desintrusão de ocupantes não quilombolas por meio de desapropriação e/ou indenização e a demarcação da área. O processo é concluído com a emissão do título coletivo, em nome da associação da comunidade, registrado em cartório sem custos para os beneficiários.
Atualmente, 36 processos para a regularização de territórios quilombolas encontram-se em andamento no Incra na Paraíba (Incra/PB). Segundo a presidente da Associação de Apoio aos Assentamentos e Comunidades Afrodescendentes da Paraíba (Aacade/PB), Francimar Fernandes, 49 comunidades remanescentes de quilombos na Paraíba já possuem a Certidão de Autodefinição expedida pela Fundação Cultural Palmares.
Fábio Augusto
Fábio Augustohttps://pautapb.com.br
Formado pela Universidade Federal da Paraíba em Comunicação Social, atua desde 2007 no jornalismo político. Passou pelas TVs Arapuan, Correio e Miramar, Rede Paraíba de Comunicação (101 FM), pelas Rádios 101 FM, Miramar FM, Sucesso FM, Campina FM e Arapuan FM.

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