Alto lá, senta aí. Quero dizer apenas que sou aficionado por histórias envolvendo máfias!
Tudo começou ainda adolescente com o livro do Mario Puzo sobre a máfia italiana nos EUA: “O Poderoso Chefão”, antes mesmo de ver o filme nas telonas.
A clássica trilogia cinematográfica de Coppola oriunda daí foi sequência lógica, inescapável. Pra mim, ainda hoje, a maior filmografia de todos os tempos.
A seguir veio, “Scarface”, Os Bons Companheiros”, “Os Intocáveis”, “Casino”, até mesmo os brazucas “Tropa de Elite”, “Cidade de Deus” e por aí vai.
Na literatura, “Gomorra”, uma dissecação sobre a máfia napolitana; “Os últimos Mafiosos” a respeito da família Corleone da Sicília (não a do “Don” do Marlon Brando); “A Lei do Cão”, sobre o narcotráfico mexicano, e por aí vai… Por aqui “O Abusado” e a história do crime organizado nos morros cariocas via olhar do chefe do tráfico Marcinho VP..
Já vai começar a julgar?
Ingenuamente, você talvez nem saiba que, aqui mesmo neste terreno inóspito, já admiti meu fascínio por histórias envolvendo sociopatas, serial killers.
Dispense esta cara de espanto, a afinidade por ambas temáticas (gangstêres e serial killers) se unem pelo fio condutor de entender como funciona a mente de seres inteligentíssimos, destoantes do conceito social padrão (pelo menos é o que pensamos), capazes de desafiar o sistema e, em muitos casos, passarem ilesos pelos crimes que cometem.
Como disfarçar o interesse por personagens e episódios tão pitorescos?
Especificamente sobre o submundo do crime organizado minha atração curiosa foi além e conseguiu quebrar uma barreira aparentemente intransponível a mim: as narrativas de séries.
Nunca consegui me ater a este formato extenso de história fragmentada, que começa e não se encerra em um único ciclo.
Alguns tabus históricos sempre me afastaram deste modelo. Além da pouca disciplina em seguir a cronologia determinada por horários específicos predeterminados pela TV (sim, meus caros sou de outra geração, antes do streaming e sua benção de escolher o que assistir na hora que bem entender).
Mas o fundamental ponto de afastamento entre meu querer e séries/novelas estava na crença irresoluta que para fazer uma história tão “esticada” assim seria inevitável “encher lingüiça”, empurrar qualquer coisa para preencher espaço. Bem, de uma forma ou de outra, continuo com essa tese, mas em menor escala que antes…
Deixando de arrudeio e voltando aos trilhos, as histórias do crime organizado me trouxeram ao universo das séries. Narcos, El Chapo, mas queria destacar Peaky Blinders (frisando que assisti ainda em 2019, portanto antes da “modinha” que se criou em torno da série aqui no Brasil. Digo isso apenas para ser Cult mesmo, admito).
O “folhetim” moderno narra a ascensão de uma organização de ciganos ingleses na soturna, industrial e miserável Birmingham do início do século XX. De controladores de sistema de apostas ilegais de corridas de cavalos, a família Peaky Blinders avança suas navalhas para “rasgar o globo”, arrumar “treta” com a máfia italiana e mexer até mesmo nas estruturas da Guerra Fria em tratativas nebulosas com a antiga União Soviética.
E é exatamente nestes tentáculos entre crime organizado e sistema que reside o outro foco da minha fixação pelas histórias de gangstêres. Mais do que meras relações escusas, a máquina de governos de países de qualquer continente são as próprias máfias. Se alimentam e retroalimentam o mundo criminoso, como tão bem relata “El Chapo” e a existência harmoniosa, controlada entre o Cartel de Sinaloa, o governo central mexicano e o DEA representando os EUA. Tudo alinhado e em perfeita simbiose existencial.
Bem, mas há os que prefiram contos de fada, histórias épicas sobre mártires, heróis nacionais tipo “O Mecanismo”, seu olhar enviesado e maniqueísta, quase exclusivo sobre um partido e a corrupção nacional, além da exaltação ao estoicismo de um certo ex-juiz, Sérgio Moro. Esse, por sinal, é um exemplo curioso: o diretor desta série apócrifa, já relegada ao esquecimento, é José Padilha, o mesmo do Tropa de Elite, citado acima na lista de obras selecionadas por mim, mesmo com algumas controvérsias.
Que bom que a história mesmo sobre percepções de adaptações ficcionais da vida real é implacável e sempre, sempre chega/chegará “impávida como Muhamed Ali”.